quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Ser lésbica

Tenho 23 anos, sai recentemente do armário, sai recentemente de casa e sai finalmente da vivência heteronormativa que estava presa em mim.
Namorei homens e vocês podem falar : nossa, mas porque essa mudança repentina?
Sinceramente, não foi repentino, fiquei tempo demais presa  a sociedade, presa a querer sempre agradar minha família, presa a sempre fazer a vontade dos outros e esquecendo de mim a ponto de não ser mais eu.
O mais interessante desse processo todo é que quando se sai do armário, descobri diversas coisas sobre si mesmo que estavam tão guardadas e desconhecidas até então.
Tocar outra mulher, ver seu sorriso, compartilhar diversos momentos deliciosos e em momento pensar no que a sociedade falocêntrica impõe.
A mulher é moldada desde pequena a não ter prazer, nem em relações heterossexuais e quando você percebe e aceita que seu prazer é com outra mulher, surge diversos pensamentos confusos e a certeza de que: você vai se sentir sozinha, diversas vezes, pois nem sua família vai te aceitar.
Lésbicas são mulheres que vivem a mercê de todo um sistema moldado para o prazer do homem, e quando esse prazer não existe mais, elas também acabam não existindo, pois sempre são deslegitimadas e esquecidas.
A história narra poucas e ainda traz pouco de sua vivência, sem criar um grande cenário, como no caso de homens.
A mulher se torna guerreira, se tornar ciente de si em todos os espaços e por isso é tão importante a semana de visibilidade, pois, nós existimos, em todos os lugares.
Vocês podem nos apagar, mas sempre vai ter uma de nossas irmãs erguendo a bandeira do nosso amor, do nosso prazer e da nossa real felicidade.

Aceitem e sofram menos. 

Texto escrito por uma 
das companheira do coletivo
Obrigado!

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Retorno das reuniões do Mandala




Já temos data de retorno! \o/
Dia 13/08 às 18h na sala do DCE (ao lado da cantina na área de vivência). Contamos com a presença de todxs





terça-feira, 14 de julho de 2015

Sorocaba tem orgulho de mim?




Hoje fui ao shopping encontrar com um rapaz com quem já fiquei uma vez, comemos, conversamos, rimos, contei para ele os meus planos e ele os planos dele para mim, nos despedimos e fomos embora. Ao virar as costas para ele me perguntei o porquê não o tinha beijado, eu queria, ele queria, porque não nos beijamos? Qual o mal de um beijo entre duas pessoas em shopping?
Isso me incomoda profundamente, pois não tem placa, lei ou determinação legal que impeça eu de beijar uma pessoa em público, já beijei várias meninas, mas não consegui beijar o rapaz. São as boas e velhas regras não ditas e já internalizadas. Não se precisa dizer, por placas ou anunciar, shopping não é lugar para homossexuais, é local de família, no máximo no cinema, no escuro e escondido, em algum filme que não tenha possibilidade de ter crianças é que você pode beijar, contanto que ninguém se sinta incomodado, ninguém perceba e volte ao comportamento “padrão” após o filme.
Se já beijei em local público, sim, nesse mesmo shopping um dia após o cinema, mas o que me levou a não beijar novamente, a interdição dos corpos nos discursos não pronunciados. Não precisava dizer, eu sabia, ele sabia e todas ao nosso lado sabiam se homossexuais quiserem frequentar tem que se “comportar”. Escrevo como um ato de reflexão, como um ato de libertação, para na próxima vez eu não ter medo/vergonha de beijar, aquele espaço, assim como todos os outros existentes na cidade, também são espaços para minha sociabilidade. Se qualquer casal pode beijar lá, eu também posso.
Isso me faz pensar que muitas vezes as coisas não mudam porque não estamos dispostos a comprar certas brigas, de ocupar de forma tranquila, com naturalidade, os espaços que são nossos, de andar de mãos dadas no shopping, de beijar em publico, de trocar afetos em um restaurante, o que nós impede de fazer isso? O modo que nós amamos? Mas são os nossos afetos que nos levam a fazer isso, independente de qual seja o sentido dele, hetero ou homo.

Precisamos ter orgulho dos nossos afetos, de amar, de ser feliz, se Sorocaba tem orgulho de mim? Não sei, eu tenho orgulho da não viver mais no armário, de pode demonstrar os meus afetos, com esse orgulho vou quebrando aos poucos as barreiras sociais e pessoais que muitas vezes o impedem de ser mais espontâneos, mas meu orgulho de ser quem sou um gay, militante, feminista, negro e imponderado.

domingo, 21 de junho de 2015

Lésbicas e a questão da (in)visibilidade


Uma das perguntas mais recorrentes que tenho que responder sobre as minhas pesquisas, trabalho com gênero, sexualidade e identidade voltada para o público lésbico, o que me motiva a pesquisar lésbicas? A resposta é ao mesmo tempo simples e complicada, por um incomodo do vazio. Quando comecei a fazer levantamento de dados para montar um projeto de pesquisa no ano de 2011, ainda sem intenção de realizar a pesquisa em si, mas para uma disciplina, algo me chamou muito minha atenção, existiam várias pesquisas debatendo sexualidade, todas voltadas para o público masculino, mesmo quando no título tinha o “LGBT”, o enfoque era nos homens gays.
Isso em um primeiro momento me causou só uma estranheza, quando começo a participar dos grupos de estudos feministas em 2012, percebo que a invisibilidade das lésbicas vai para muito além da questão da sexualidade, elas perpassa uma questão de gênero, são invisibilizadas por que a sociedade não olha para a questão da sexualidade da mulher e quando olha é numa perspectiva patologizante. Ao perceber isso sofri um incomodo incontrolável, que me levou então a iniciar o trabalho pesquisando a identidade lésbica.
Porém, se as mulheres lésbicas fossem invisíveis só na acadêmia, acho que meu incomodo não seria tão grande, mas ao olhar o histórico do movimento LGBT, as mulheres lésbicas são invisibilizadas o tempo todo. No coletivo Somos, um dos primeiros grupos de militância pelos direitos LGBTs, as mulheres demoraram muito para ingressar, quando entraram sofreram com o machismo e preconceito existente dentro do coletivo, criando então um grupo militante lésbico. Dentro do movimento feminista, por muitos anos, as mulheres lésbicas também foram invisibilizadas, havendo vários relatos em que as outras militantes diziam: “podem participar, mas não falem de sua sexualidade”.
Quando debatemos sexualidade, as mulheres não são vistas como seres sexuais, que sentem desejo, prazer e tem orgasmos, pois esses “defeitos” são das “putas”, “vadias” e “promiscuas” seres que não são mulheres, muito menos humanos, mas meros objetos para os prazeres masculinos. Deste modo, discutir as relações afetivas e sexuais entre dois seres que não tem sexualidade, é desnecessário, pois se tiver sexualidade, são seres impuros que não devem ter espaço dentro do meio social.
Se faz necessário neste momento ter muito orgulho de ser lésbica, de pôr a cara no sol, de enfrentar as adversidades, pois o movimento LGBT e o feminista devem muito a elas, que mobilizaram as primeiras paradas LGBTs, que cuidaram dos homossexuais durante a epidemia AIDS, que lutaram pela liberdade sexual das mulheres, que ao colocar sua sexualidade em pauta, subverteram os valores sociais e colaboraram na luta pela liberdade sexual como um todo. Uma das frases que mais encontrei em minha pesquisa em blogs voltado para o público lésbico é que não tem nada mais revolucionário que o amor lésbico, pois tem a potência de deixar para as esferas de poder patriarcais que não precisa dela para existir, tenho que admitir, amor lésbico é revolucionário, revolucionou até meu modo de ver e estar no mundo.
Obrigado a todas as lésbicas e vamos juntos na luta!
D.C.R.

sexta-feira, 5 de junho de 2015

O Coletivo e o Armário


Muitas pessoas pensam que a saída do armário é um ato individual, uma pessoa que tem uma sexualidade que não é a heterossexual, resolve tornar público algo que pertence ao âmbito privado. Acreditasse muitas vezes que a saída do armário é uma escolha, ou algo que deve ser tratado e pensado única e exclusivamente pelo indivíduo. A questão que a saída do armário não é só exteriorizar, ou tornar público, algo que é do privado, mas reafirma as questões que envolvem a vida privada também são questões políticas, ou seja, tangem a vida pública, perpassando as relações coletivas que mantemos.
Sair do armário então não é algo precisa ser solitário, ou seja, sem apoio de outras pessoas que passaram ou ainda passam pela situação de se assumir dentro de determinados segmentos sociais. A saída solitária pode ser muito dolorosa, tendo em vista que muitas vezes faltam exemplos de representatividade para os não-heterossexuais, o que vemos constantemente na mídia são papéis estereotipados, que não representam de fato a realidade e a diversidade existente.
Partindo desse ponto, o fato de estar dentro de um coletivo, seja o Mandala, ou junto com um grupo de amigos que lhe entenda e lhe auxilie no processo é sempre positivo, pois estando em contato com outras pessoas, percebe-se a diversidade existente entre os homossexuais, bissexuais e transsexuais, o que permite um melhor entendimento do que sentimos e passamos e um maior reconhecimento de uma “identidade” que nos ajudará a dialogar com nossos desejos.
Além da diversidade representativa, estar com um grupo de pessoas que te ouça, que compartilha a mesma experiência e vivência que passou por situações tão complicadas ou às vezes mais complicadas que a nossa, nos dá um redimensionamento do processo de autoaceitação e afirmação de nossos desejos e expressões de gênero. Um filósofo que gosto muito, Spinoza, vai falar que a ação no coletivo aumenta nossa vontade de viver, nos fortalece e nos permite ir além do que conseguiríamos sozinhos, pois o ser humano é um ser social que se constrói, modifica e potencializa pelos encontros que tem com o outro. Sendo assim, o coletivo serve como base para aumentar a nossa potência existencial e nos dá força e apoio no processo de se aceitar e assumir.

Pensando que a saída do armário é um processo social, implicado no coletivo, nas relações que construímos e nas bases afetivas que criamos, o Coletivo Mandala tem como base de ação a união e a potência pelo afeto, ou seja, na criação de um campo de convívio no qual possamos trocar experiências, fortalecer os vínculos. Demonstrando assim, que ser homo/bissexual, transsexual, assexual, não binário, queer, ou qualquer “coisa” que não se encaixe nos padrões estabelecidos, não é motivo de vergonha ou medo, mas sim de orgulho, pois simbolizamos a diversidade do ser humano, as potencialidades da existência, as infinitas formas dos afetos e desejos, ser “estranho”, não é uma ofensa, mas sim um orgulho, pois não nos dobramos diante das tradições impostas, mas assumimos nossa estranheza coletiva para abraçarmos a felicidade de uma existência plena.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

NEGDS e Mandala apresentam: A revolta de Stonewall

O Núcleo de Estudos de Gênero e Diversidade Sexual (NEGDS) junto com o Coletivo Mandala convidam à todas e todos para assistir e debater o documentário "Stonewall Uprising", no dia 04 de Maio as 18h no Atlab 121.

Sinopse: A revolta de Stonewall, como ficaram conhecidos os seis dias de confronto com a polícia, marcou o momento da virada do movimento pelos direitos homossexuais nos Estados Unidos e em todo o mundo. O documentário A Revolta de Stonewall (2010, 80 min.), produzido por Kate Davis e David Heilbroner, apresenta relatos de testemunhas oculares da revolta e raros documentos de época. O documentário é baseado no livro de David Carter intitulado Stonewall: The Riots that Sparked the Gay Revolution.





quinta-feira, 23 de abril de 2015

Carta à comunidade UFSCar referente às eleições do DCE



Mandala, coletivo de diversidade sexual e livre orientação de gênero, vem por meio deste, divulgar à comunidade da UFSCar nosso posicionamento frente ao processo eleitoral do Diretório Central dxs Estudantes (DCE).
O processo democrático é uma construção histórica, conquistado com muita luta.  A UFSCar tem um passado de esforço por esse processo, isso fica claro pelo modo como são escolhidos a reitoria e as chefias de centro, departamento e curso. Esperamos que a democracia seja reforçada nessas eleições e que a comunidade UFSCar construa, junto à gestão do DCE, uma universidade pública, gratuita e de qualidade, livre de todos os tipos de preconceito e discriminação.
O Coletivo Mandala não apoiará nenhuma chapa candidata ao DCE, uma vez que dentro do nosso coletivo temos membros e apoiadores de mais de uma chapa, e que visamos a liberdade democrática de todos os integrantes. Assim, o coletivo optou por não sair em apoio a nenhum dos participantes do pleito. Todavia, cobramos de todas as chapas concorrentes o compromisso com a comunidade LGBT, apoiando suas pautas e lutando pelo fim do machismo, do racismo e da LGBTfobia dentro e fora da universidade.
Repudiamos toda e qualquer manifestação de transfobia que tenha ocorrido durante esse processo eleitoral, assim como qualquer outro ato de preconceito que ainda possa ocorrer. Nesse sentido, devido às denúncias feitas,  indicamos o NÃO VOTO na chapa Renovação, que tem se mostrado transfóbica e contra a liberdade LGBT. Outro fator determinante para esta decisão é que o Mandala acredita que o DCE deve ser multicampi, deste modo, não podemos apoiar uma chapa que não tenha um representante de Sorocaba, ainda mais sendo nós um coletivo sorocabano.
Como pauta de luta, a qual pedimos o apoio de todas as chapas, temos as seguintes revindicações:

1. Assistência estudantil LGBT: muitos jovens ao chegar na universidade e encontrar um espaço com maior abertura, ou por estar com mais maturidade e consciência do que sentem, resolvem assumir sua sexualidade e/ou identidade de gênero para a família, alguns desses jovens acabam sendo expulsos de casa, abandonados pela família e ficam desamparados para continuar os estudos. Sendo assim, se faz necessário que a universidade tenha um programa de assistência a LGBTs que se encontram nessa situação, garantindo moradia e alimentação a fim de reduzir a marginalização dessas pessoas cuja orientação sexual e/ou de gênero sofre ainda discriminação pela sociedade, condenando essas pessoas a situações de injustiça e opressão;

2. Implementação da normativa que permita a utilização dos banheiros por pessoas trans e não-binárias: uma das coisas mais simples da vida é a utilização dos sanitários, mas isso pode se tornar uma experiência horrível para pessoas trans ou não-binárias. Todo o desconforto é sempre proveniente da mentalidade transfóbica e discriminatória que não reconhece nem legitima as identidades trans e não-binárias. Para evitar violência e discriminação, essas pessoas devem ter garantido o seu direito de usar o sanitário que lhe deixar mais confortável e segura. A implementação de uma normativa que garanta essa liberdade de utilização dos sanitários é um passo adiante no processo de aceitação social dessas pessoas e sua identidade;

3. Apoio do DCE às atividades do Mandala e demais coletivos LGBT da Universidade: o DCE deve afirmar seu compromisso com todxs xs estudantes a partir de uma postura de apoio à diversidade sexual e de gênero, portanto deve encorajar e auxiliar de todas as formas possíveis os grupos e coletivos que se organizam para esse fim, demonstrando o apoio às nossas causas que buscam o bem-estar social e o fim das (LGBT)-fobias;

4. Campanha de prevenção DST/AIDS: O número de pessoas que vivem com HIV/AIDS tem crescido nos últimos anos, principalmente entre os jovens, independente da orientação sexual. A falta de informação e conscientização sobre os meios de transmissão das doenças ainda é o principal fator para o aumento do número de casos. Deste modo se faz necessária a existência de uma campanha constante para a informar aos estudantes, juntamente com a distribuição de preservativos masculinos e femininos.

5. Combate ao preconceito contra pessoas que vivem com HIV/AIDS: campanhas de prevenção não bastam. Vivemos em sociedade e com pessoas que levam suas vidas adiante mesmo com HIV/AIDS. Essas pessoas não devem sofrer discriminação por conta da sua condição de saúde, já que esta não influencia em todos os fatores da sua vida. Pessoas que vivem com HIV/AIDS podem seguir suas vidas normalmente e o DCE deve ter compromisso com a disseminação de informações a respeito, numa luta que seja pelo fim da discriminação, sempre.

Sem mais,
Coletivo Mandala - UFSCar campus Sorocaba
23 de Abril de 2015


sexta-feira, 17 de abril de 2015

Relato de número #3 "Pai".

   O coletivo Mandala continua a publicação de relatos de pessoas LGBTQIA sobre suas experiências de vida, com o objetivo de nos identificarmos nessa luta em comum.

   Caso queira compartilhar seu relato conosco temos um formulário de contato anonimo.

   Para hoje o relato intitulado "Pai". Boa leitura :)

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" Pai,

Então, como iniciar algo que não sei como começar e não sei como irei terminar, deixarei que minha mente e palavras se façam vivas. Partiremos do início, tenha paciência.
Quando criança, eu pouco me importava com as coisas a minha volta, só queria me divertir e aproveitar o momento, hoje eu não posso me dar a esse luxo. Lembro-me de poucas coisas dessa fase, de quando morávamos em São Paulo, de quando morávamos no Jardim Pacaembu com a vovó, quando fomos morar no São Guilherme e eu não queria que a vovó dormisse na casa dela, mas comigo e com a mamãe. Lembro-me das festas anuais de meu aniversário e das do Doh. Recordo-me da família reunida, de todos juntos e felizes, mesmo que não fosse tudo como gostaríamos, estávamos ali juntos. Tenho nuances do vovô arremessando seu chinelo contra mim, de suas dificuldades em se locomover e nossas idas ao hipermercado Extra. Ficávamos no pula-pula e outros brinquedos lá fora enquanto vocês faziam as compras, o vovô ia de cadeira de rodas elétrica.
Agora me veio um fato específico, quando me perdi e tive que pedir ao locutor do Extra que chamasse vocês para me localizar. Ah como eu era bobinho e inocente. Neste exato momento ouço Celine Dion – My Heart Will Go On, sei que você gosta muito de cantá-la no karaokê.
Observação: faz três dias que estou pensando em escrever esta carta, já estava decidido, mas buscando dentro de mim como, o que e o porquê de escrevê-la. 
Minha infância foi muito feliz, divertida e incrível, até você e a mamãe se separarem. Na época eu achei a melhor coisa, não estava mais sustentável as brigas e discussões, mas hoje vejo e consigo mensurar os efeitos da separação entre vocês, de como tudo teria sido bem diferente, enfim... 
Lembro-me bem do senhor dizer: “Filho, papai nunca deixará de ser seu papai, ele só irá trocar de casa”. Enquanto eu chorava aos prantos e não conseguia entender muito bem. Voltaremos nesse assunto depois. 
Você se mudou, foi morar com sua irmã, eu, mamãe e Doh continuamos a morar na mesma casa no Jd. São Guilherme, a casa estava a venda. Mantínhamos um relacionamento paternal efetivo e próximo, nos vimos com frequência, saímos sempre, nos divertíamos tudo junto ao Doh. Você nos dizia que nos amava, que sempre estaria conosco e que as coisas iriam melhorar. 
Eu estudava, adorava estudar, desde lá já amava estudar. Ler, ir para a escola, ver meus amigos e nessa fase já sofria com bullying por ter trejeitos homossexuais, mas eu nem sabia o que era isso, e eu tinha o quê? 7-9 anos, sim eu já apresentava comportamentos que para época era taxada de homossexual. 
Bem, eu não ligava muito para isso, mas sofria de algum modo, me sentia ridicularizado, mas acuado ao mesmo tempo, não sabia o que fazer e como fazer para acabar com aquilo. Fui me calando e consentindo e vivendo com aquilo como se fosse normal. Hoje noto que não tinha mesmo amizades masculinas, sempre fui rodeado de meninas, amigas, e isso para mim era normal, porque não seria? Elas me faziam bem e conversávamos sobre tudo. Sim, eu não sentia vontade de beijá-las, mas sim de cuidar delas, me preocupava com elas, porque eram as únicas que não me xingavam e me faziam aquele tipo de “brincadeira”. Pularemos essa parte, mas digo que foi nessa fase que eu me descobri gay, bicha ou como o senhor preferir. Não, eu não sabia o aquilo me traria, como eu seria, o porquê daquilo, não sabia como lidar com a informação, eu a simplesmente tinha dentro de mim, como algo que nasceu comigo.  Agora escuto Time After Time – Cindy Lauper.
Compraram a casa, a bisa veio a falecer, a sua tia estava desesperada para vender a casa e Deus nos abençoou com esse teto que hoje cobre minha cabeça, pois sabemos que não seria nada fácil encontrar outra casa com a grana na qual mamãe possuía. Morar um pouco mais adentro da zona norte não era de todo ruim, mas sofri com a mudança: rua nova, sem meus amigos e a terrível ideia de ter que mudar de escola. Vocês, refiro-me a mamãe também, escolheram por não me trocar de escola e decidiram pagar uma van, o que não deu muito certo. Até hoje procuro pela Erica nas muitas vans da cidade, a motorista da van, eu adorava ela. E foi muito bom para eu não ter saído da escola de onde eu estudava. --- Uma escola assim, que educa e ensina (cantando)... A como eu amo aquela escola!
2007 se inicia, eu ainda não completei 11 anos. Bem, não há outra opção, terei que estudar na escola do bairro. O bullying se torna mais agressivo, frequente e danoso a mim. Eu utilizo de minhas possibilidades, para me esquivar um pouco de toda a maldade vinda de todos, começo a “namorar” uma menina chamada Bruna. Meu primeiro beijo. Era minha melhor amiga e me serviu de fachada, acho que ela sabia.
Na quinta série eu briguei duas vezes com um único menino, por motivos dele me chamar de bicha, gay, boiola, bambi, marica. Eu, só queria estudar e aprender, ver meus novos amigos e jogar basquete. Fazia basquete pela escola na época, mas não deu muito certo, magro eu, não dava. 
2008 não havia prospecções de melhora, minhas férias acabavam e eu já amargava a mesmice de ser alvo de toda e possível zoeira. Mas a escola mesmo assim me era agradável, eu tinha professores legais, inteligentes que me cativavam e não me fizeram desacreditar na educação, ao mesmo tempo em que, eu via o que a educação poderia me trazer no futuro. Nesse ano comecei a sonhar em entrar na ETEC e a cursar algum idioma no Centro de Estudos de Línguas. Nesse mesmo ano, eu tive uma professora que até hoje é minha amiga, que me achava o garanhão e aquilo me fazia bem, ela entrava no meu sonho de querer enganar as pessoas e me fazia acreditar nele.
A única briga que tive neste ano foi com o David. Naquele fatídico dia estávamos com aula vaga, estávamos brincando de tacar bolinha de papel um no outro, cada um com seu grupo de amigos próximos, desde que o David quis tomar um espaço no qual não pertencia e começou a tacar papéis em mim. Eu pedi a ele que parecesse, mas ele disse que estava de graça porque era gay; sempre a mesma história. Sei que entre suas palavras e as lenhas colocadas por muitos, eu fui tirar satisfação com ele e o machuquei bastante, só parei, pois o Robert, meu parceiro de vôlei, mais forte que eu me segurou. É, já havia começado a jogar voleibol pela escola, Flávia sua linda. Voltando a briga, eu tirei sangue de sua boca e nariz, machuquei sua costa na lousa e fomos parar na diretoria. Eu como bom aluno não sofri nada, apenas chorei e expliquei o que havia acontecido, estava muito nervoso. Ao sair da sala do diretor, uma professora eventual da escola, que reside até hoje na rua da sua irmã, parou-me e perguntou-me porque eu estava a chorar daquele jeito e eu não sabendo o que falar disse que as pessoas não paravam de me incomodar. Ela segurou uma de minhas mãos, não me conhecia muito, ademais deu ser um conhecido aluno pelo voleibol e desempenho e disse mais ou menos assim:
“Menino, Giovane as pessoas sempre tentaram te derrubar, te colocar para baixo e fazer você chorar. Eles têm inveja de você, por tudo que você é e querem te magoar, entre outras coisas e continuou, mas cabe a você dar um basta, parar de chorar por eles, seja mais você, você é inteligente, joga vôlei, é bonito, estudioso. Pare com isso, ignore. Não ligue e siga seu caminho, será melhor para você. Ah Santa “Efigênia”, você mudou minha vida e eu nem sabia. Daquele dia em diante, eu nunca mais briguei e não me recordo de discutir, bater boca, xingar alguém por me sentir magoado, ainda mais por ser gay. Eu comecei a ver que não valia a pena. Mas não seria o fim de tudo.
Eu jogava voleibol muito bem, em equipe ou em dupla com o Robert, todos queriam ganhar de nós, éramos famosos na escola e nos jogos escolares, além disso eu sempre era destaque do bimestre por minha sala, subia ao palco para receber os agradecimentos da escola pelo desempenho em quadra e na pista, pelo atletismo. Ganhei uma bola de vôlei por ter tirado a segunda melhor nota da escola numa prova interna. Flávia foi minha professora de educação física da sexta série, ela que me incentivou a jogar vôlei, me ensinou a jogá-lo e me jogava para frente por meio dele, mesmo sem saber. Foi ela quem me colocou no atletismo e fui chamado para correr pela cidade, mas não deu certo naquele momento, estudava de tarde e o treino era de tarde. No ano seguinte estava eu lá para iniciar meus treinos depois de novamente ter competido pela escola e ser sido chamado. Arthur me modelou e Miguel me aperfeiçoou. Até hoje sinto falta do vento correndo na minha cara com a corrida, a euforia, o medo, a adrenalina, a vontade de ganhar. Ainda sinto falta de toda aquela atmosfera, meu técnico era meu mentor, um homem não inteligente, mas sábio, que me fez crescer mentalmente e acreditar na vida. Fiz amizades e consegui desenvolver meu corpo, até hoje tenho vantagens por ter feito atletismo. Lá era o único lugar no qual eu tinha amigos, colegas e um professor, mas diferentemente da escola ninguém me chamava de gay ou coisa do tipo, eu amava aquilo. Mas não deu para continuar. 
No decorrer de minha estadia na escola do bairro e no atletismo, você, meu pai, ainda estava presente, mas mudado. Já não tínhamos aquela relação tão afetiva, não conversávamos tanto, você quase não sabia de minha vida, eu não sabia como contar sobre ela e via você distante, estávamos nos afastando, eu com meus interesses de adolescente e você com seus de adulto. Eu tinha escola, atletismo e casa, casa essa que não me dava apoio moral nem psicológico para continuar, mamãe não ia às reuniões da escola tão pouco você. Mamãe não se importava com meus treinos, até recriminava-os uma hora ou outra, queria comida na mesa, dinheiro, estava em falta, eu tinha 13 anos, queria estudar, treinar e descobrir quem eu era. Você pediu demissão do trabalho, abriu sua empresa, ela não fornecia todo o dinheiro que seu emprego, as coisas começaram a piorar, a falta de dinheiro se tornava cada vez mais aguçada e frequente, as coisas iam piorando e piorando, eu continuava a querer: estudar, treinar e me descobrir.  Até que tudo cedeu, a empresa faliu, mamãe engravidou, madrasta engravidou, o Doh trabalhava em sua empresa e não era obrigação dele também me sustentar ou me dar o que comer, mas o fazia. Eu tinha quem me ajudasse, bastava para vocês ficarem mais tranquilo, primo/segundo pai e a vovô estavam ali para me dar internet para meus trabalhos, dinheiro para meus passes de ônibus - já estava no primeiro ano do médio, para meus passeios, calçados e roupas. Mas todos contra mim por eu não trabalhar, ser revoltado com você. Mas eu só queria estudar, treinar e me descobrir. Me foi roubado. 
Eu larguei o treino e no dia seguinte enchi a cara na primeira baladinha que fui, acabei por beijar o primeiro menino de minha vida e por chupá-lo na rua. Eu estava louco para tirar todas as amarras que me tinham, mas eu não podia, não tinha coragem. As perguntas de sempre: “Deus não me amará mais? Meu irmão sairá de casa por mim? Meu pai não vai me amar mais? Minha família terá nojo de mim?”. E outras de questionamento: “Deus, por quê? Porque eu? Eu não escolhi isso? Tira isso de mim? Por favor, me ajuda? Eu não quero sofrer?”. 
Nessa fase meu primo/segundo pai  era meu braço, minhas pernas, minha mente, tudo era o ele. Primo/segundo pai compra isso, faz isso, preciso desabafar sobre isso. E ele estava sempre lá, chorava comigo, tentava me acalmar e entendia o meu sofrimento, queria sofre-lo por mim, queria faze-lo cessá-lo, mas não podia. Quando ele não estava eu chorava escondido, abafado, não queria que soubessem. Eu não sabia o que fazer! Mas continuava a acreditar que a melhor coisa era me matar.
Quantas vezes eu não pensei em tirar minha vida, contava ao meu primo/segundo pai e ele de toda forma tentava e argumentava sobre o por quê de não fazer isso. Eu mesmo sem coragem, fazia das palavras deles o aval para não me... Você papai, me colocou muita dor, sofrimento, mágoa, rancor e medo dentro do coração, eu não sabia por que e tentava entender suas palavras: “Prefiro ter um filho morto a gay”; “Deus criou o homem para a mulher”. “Eu prefiro ter um filho bandido, ladrão do que gay”. Eu estudava, era um dos melhores alunos, meus professores me admiravam e me davam como exemplo para a sala, eu fazia esportes, estudava outras línguas e isso não importava ao senhor, eu era gay. Ah como doía, como eu chorava, como eu sentia sua falta. 
Hoje, agora, de uns tempos para cá, eu consigo entender suas duras palavras. Na sua mente eu iria mudar pelo senhor e pelo seu modo de falar, de dar medo, mas eu não podia, não cabia a mim, como não cabe. Eu não escolhi sofrer, não escolhi ser tratado diferente, não escolhi ser xingado, não escolhi sofrer bullying, não escolhi ser escolhido, não escolhi ser taxado, não escolhi ser ridicularizado, não escolhi ser assim, eu só me sentia assim, era assim, me via assim e por quê? Nem eu mesmo sabia. 
Comecei a frequentar a igreja por que senti em meu coração que era necessário para que eu conseguisse a tão desejada mudança, minha igreja não me julgava, não me tratava diferente, me amava por que sou filho de Deus. Motivava-me a participar mais e mais das coisas Dele e por Ele, e eu ia, fazia tudo que me era possível. Com o tempo as coisas, como meu primo/segundo pai sofreu antecipadamente, me faria sofrer. Eu não conseguia a transformação e isso me frustrava, eu tentava, eu me renegava, eu me escondia, me matava e fazia e estava lá, mas não mudava, meu coração, minha mente e meu corpo fugiam do controle as vezes e eu queria outra vida. Porém eu pensava: e minha família? E a sociedade?, Não, não posso. Eu chorava, eu sofria, eu gritava, eu pensava em me matar como antes, até que eu comecei a me afastar da igreja e as coisas começaram a piorar, por que fiquei em cima do muro. Não suportei e me afastei de vez, depois de muito sofrimento, muitas lágrimas e decidi não ir mais. Mas eu ainda não sabia o que queria, só queria meus pensamentos, minha solidão interna. 
Começa 2014, eu acabará de voltar de Joinville, de ver meus familiares maternos que não via há 13 anos, voltei em esplendor e do nada, perdi minha virgindade, com um bailarino, com um homem. 
Eu continuava a sofrer por você, pela família, pelos meus amigos, por todos, menos por mim. Começa a florescer em minha mente a ideia de que eu não podia continuar daquele jeito, eu não aguentaria por muito tempo, eu precisava ser eu, eu precisava me conhecer de verdade, experimentar um mundo diferente, eu sonhava com a faculdade longe de casa para ver se era o problema e deu certo. Ah!!!
Sai de casa com 17 anos para fazer faculdade, que orgulho de mim, disposto a enfrentar tudo, a me fazer novo. Antes de ir conto-lhe que falei a todos da família que era gay, mamãe chorou e disse que sempre soube e que me amava do mesmo jeito, os outros não veem ao caso, mas não tinha coragem de contar ao senhor naquela hora. 
Sua mãe, vovó, já sabia fazia alguns meses, me pegou chorando em sua casa, em sua cama de forma incessante e descontrolada, começou a chorar comigo e não parava de me perguntar por que eu chorava  e pedia para eu parar de chorar, eu ainda chorando e soluçando, disse: “Vó, eu sou gay”. Ela me abraçou, disse que me amava e que já sabia e me contou coisas que nunca havia imaginado. Eu chorava por que acabará de ver um filme que tratava da relação entre um pai e um filho, eu só queria tê-la, a minha com a sua já não existia, já havíamos de tal forma nos separados, já havíamos deixado um ao outro, já tínhamos brigado e discutido algumas vezes, eu queria entender por que tudo isso havia acontecido, eu sabia, mas não me dava por satisfeito, eu queria tê-lo, mas não podia, me fazia mal, a distância era melhorar, a memória não me satisfazia, mas era necessária. Tukinha, nunca mais, filho, nunca mais, vindo de você não.
Você me levou a Uberlândia, ajudou-me com os papéis da faculdade e me deu dinheiro pelo tempo que estive lá, foi umas das únicas coisas que fez por mim em muitos anos e a última. 
Lá comecei a me conhecer, a me fazer João Guedes Silva. Por anos havia vivido como fantoche, como personagem de um filme que durou 18 anos. Boyhood sou eu. Foram 6 deliciosos e sofridos meses em Minas, eu conheci pessoas interessantes, locais legais e me fiz. Consegui assumir a todos e a tudo quem eu era, até mesmo a você, meu maior pesadelo. Descobri meu primeiro amor no qual continua a ser meu grande amor. 
De lá você tinha notícias de mim, mas pouco falava comigo por que namorava e não tinha estômago para ver fotos minhas com ele. Dizia coisas que eu acabava por ficar sabendo e que me magoavam, que continuavam a doer em mim. Como: “Quanto mais longe ele estiver de mim melhor”; “Queria eu poder doar meu sangue que ama buceta a ele”, entre outras. 
Aquilo foi me fazendo ter nojo de você, te odiar, eu já não precisava do seu amor, do seu carinho, do seu dinheiro, havia voltado, eu já tinha alguém para me dar amor, me dar carinho e não me julgar, meu namorado. Tudo foi se tornando cada vez melhor, sempre com muita luta e sofrimento. 
Pai, César, eu não lembrava quem era, nem quem um dia foi, só quando falavam de ti, mas quando falavam me doía, eu ainda sofria, mas por quê? 
Até que tudo muda, se transforma, sai do lugar. Chego do trabalho e minha mãe diz que irá se mudar para Curitiba em poucos dias, que tenho que arrumar um lugar para morar, que ela alugará a casa, que isso e aquilo. Meu chão caiu, uma fenda imensa e sem fim se abre a minha frente. Não sei o que fazer, como fazer, eu chorava, eu sofria, mas ainda tinha alguém para ficar do meu lado, meu namorado, que decorrente de tudo o que sucedeu teve que voltar a sua casa e o meu primo/segundo pai que me salvou com R$800,00. 
Hoje me encontro sozinho na maioria do tempo, converso com meu namorado pela internet durante todo o dia, falo com o meu primo/segundo pai também, que sempre vem me visitar, me trazer o que comer e me ajudar com o dia a dia. 
Lembra que disse que voltaríamos no assunto: “Você nunca deixaria de ser meu pai”. Então chegou a hora. Você disse isso quando se separou da mamãe e disse novamente quando em abril eu falei a você que era gay e realmente não tem como você deixar de ser meu pai, mesmo que eu queira e eu não quero. No momento que no prazer de ter gozado na vagina de minha mãe nos foi selado o que teremos para sempre, o laço Pai e Filho. Pode soar feio, mais é como disse. 
Eu queria poder dizer que as coisas estão todas em seu devido lugar, mas não estão. Você como eu e toda a família sabe que não, pelo menos entre nós. Que seja eu o primeiro a dar um passo. Digo a você porque depois de ter ido à casa da sua irmã Dulce, na qual não via a algum tempo e, ouvi-la falar sobre uma história parecida com a nossa, mas que não pode ser mudada, decidi engolir meu orgulho, matar-me novamente, deixar de lado minha luxúria, afastar alguns sentimentos, esconder algumas opiniões e filosofias e princípios, pelo que temos em comum, pelo que temos de semelhante. 
Somos descendentes, temperamentais, nervosos, donos de nossa razão, cabeças duras, chatos, mandões, birrentos, inteligentes, sonhadores, sem falar nas semelhanças físicas. Resolvi deixar de lado as diferenças e dizer que TE AMO e que você continua a ser meu PAPAI e eu seu FILHO, seu TUKINHA. Se antes você tinha uma desculpa para não me visitar hoje não tem mais, moro sozinho, venha quando quiser, não precisar trazer nada, o pão e o café posso lhe oferecer assim como um abraço e uma boa conversa. Não estranhe eu estar diferente, já faz quase um ano que não nos vemos e nos falamos. Será que ainda reconheço sua voz? E seus traços? Acho que você sou eu envelhecido e um pouco barrigudo!
Algumas coisas não precisam ser ditas quando vier, nem perguntadas, não vamos tocar em assuntos delicados no começo, nem falar daquilo que não precisa ser dito, vamos apenas nos olhar e ver que somos, SERES HUMANOS. Que temos sentimentos, que sofremos igualmente por sermos, SERES HUMANOS. Eu mesmo querendo muito que um dia tudo isso fique distante não sei se será possível, que um dia possamos todos nós esquecer e seguir em frente sem mais lágrimas. 
Deixemos nossos corações em pedaços pelo que um causou ao outro para fazer tudo novo. Nossa relação se faz nova a partir de agora, totalmente. O que espero de você é que me perdoe por ser quem sou, que consiga me amar mesmo eu sendo quem sou, SEU FILHO. 
Deixemos ao destino e as coisas da vida os motivos pelo que tudo ocorreu, somos todos culpados pelo que aconteceu, sem culpas obrigatórias e pesos por qualquer coisa que seja. 
PS: Eu não chorei em nenhum momento por que não tenho por que chorar o que aconteceu aconteceu. O que me importa é daqui para frente, quero esquecer o passado e tentar viver contigo como com todos que amo daqui para frente. Eu disse tudo que disse para tentar aproximar você da minha vida nos anos que não esteve presente.  
    

Daquele que sente muita saudade e muito por tudo que aconteceu.
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domingo, 8 de março de 2015

Contato


Atendendo a pedidos, o Coletivo Mandala está disponibilizando um formulário para contatos anônimos, caso você deseja fazer denuncias, tirar duvidas, desabafar, etc.
Basta clicar em Contato
Lembramos também o dia de nossas reuniões, que serão retomadas essa semana!

8 DE MARÇO, DIA INTERNACIONAL DAS MULHERES

No dia internacional das mulheres, O Coletivo Mandala pública uma coletânea de textos feitos por algumas de suas integrantes e colaboradoras.




Dia Internacional da Mulher


Tatieli Escarllet


Ótimo, chegou o Dia da Mulher, o famoso e bastante discutido oito de março. Vamos dar chocolates para nossas mulheres? Ou vamos parar e pensar nas luta travada por elas todos os dias e principalmente nesta data oficializada pela ONU?
Eu sou a favor de pensar. A escolha desta foi escolhida por dois motivos. Primeiro pela proposta feita pela Clara Zetkin em 8 de março de 1910 durante o II Congresso Internacional de Mulheres Socialistas da criação do Dia Internacional da Mulher e segundo pelo incêndio no dia 25 de março de 1911 em uma fábrica têxtil em Nova Iorque onde 146 pessoas morreram, sendo 125 mulheres.
Mas não é só nesse dia que é levantado as questões de direito, igualdade, liberdade de expressão e a luta contra a opressão. É uma batalha diária que é travada por todas as mulheres que não suportam mais ser caladas e oprimidas por uma cultura machista. A voz dessas militantes que levantam a bandeira em busca de melhores condições aos poucos sai do armário e o discurso delas é repetido por muitas outras e até por homens que apoiam.
Anônimas estão na rua, mas famosas também estão ai para ajudar cada vez mais mulheres se tornarem empoderadas, ou seja, informadas sobre seus direitos e incentivar a busca por soluções nas opressões sofridas por elas. Patricia Arquette e seu discurso no Oscar, Beyoncé e Walesca Poposuda com suas músicas, Emma Watson na ONU e entre outras midiáticas que estão tornando polêmico esse levante de mulheres cada vez mais motivadas a ir às ruas.
Mas polêmica é bom? Claro. Tudo que é polêmico, pop, contestador e que “causa” é fundamental, já que ganha espaço para debate, provoca curiosidade e corre nas mídias. E o que buscamos é que essa luta ganhe destaque mundial.
Então, o que faremos no oito de março? Chocolate ou aumentar os debates a cerca da luta feminista? A resposta é aumentar os debates. Não queremos ser caladas e nem oprimidas. Queremos ter direitos e liberdade, sem ter medo de ninguém. Quem decide o nosso destino e o que faremos somos nós mesmas. Vamos se tornar uma única voz e ir para frente de todos batalhar por um mundo igualitário, sem machismo e preconceitos.


            
           
Aceite essa rosa

Débora Mestre

“Aceite essa rosa, aceite esse bombom. Mas aproveite que é só por hoje; amanhã a misoginia tem que continuar”.
Essa sempre foi minha crítica e minha visão geral sobre o 8 de Março. Nunca passou de uma hipocrisia, e com vieses capitalistas, pra deixar o caso ainda mais triste e revoltante. Ter um dia no calendário nunca me agradou - é o atestado de desigualdade para qualquer minoria ou escória social. Um dia, entre os 365 do ano, reservado para que a magnânima elite masculina cis heteronormativa e branca se lembre de que existe algo além de suas fortalezas fálicas regadas de testosterona.
Sim, o “Dia da mulher” traça um paralelo com todos os outros dias tão generosamente concedidos pela elite, como o Dia da Consciência Negra, o Dia Internacional da Luta Contra a Homofobia, pra citar só alguns. Não existe e nem pode existir um “dia do homem” ou “dia do orgulho hétero” com pretensões de se atingir igualdade, por que ter um dia, por si só, já é um sinônimo de desigualdade gritante.
Partindo desse princípio, começo a enxergar o lado positivo (tênue, fantasmagórico, quase inexistente, mas positivo) do 8 de Março. É a elite patriarcal assumindo que existe injustiça. Assume, de seu modo tosco e displicente, ao homenagear a mulher, os negros, a população LGBT etc etc, que não é fácil viver em nosso modelo de sociedade carregando o fardo de não fazer parte do grupo privilegiado.

Já que é assim, já que fatalmente a injustiça vigora e essas datas existem, usemo-las com sabedoria. Para mostrar que estamos aqui e não estamos resignados a esse destino marginalizado que nos é imposto há tantos séculos. A luta deve ser diária, constante; irritemos e desconstruamos nossos opressores até que seus preconceitos sejam diluídos e esquecidos. Viva ao orgulho dos oprimidos, viva ao grito de sobrevivência! Continuamos aqui a despeito de tudo que nos fizeram e estamos cada vez mais fortes!


Resistência 

Thais Rodrigues

Quanto mais me oprimem mais subversiva me torno
Sua repressão não me para
Nossa luta não é de hoje, carregamos o sangue de muitxs.
Nós não costumamos aparecer nos livros
De loucas a desqualificadas
De tudo já fomos chamadas
Campo de concentração, hospício, prisão
Nada disso cala nossa voz:

_ Não! Não! Não! Não passarão!

Um ode a desobediência

Renata Vieira

Embora me seja muito desconfortável ter que precisar de um dia que simbolize a luta pela igualdade entre homens e mulheres, acho que a ode hoje vai para as desobedientes.
Às que disseram não ao namorado que ousou ter alguma autoridade sobre a roupa que vestem, sobre os lugares em que andam e a que horas passeiam sozinhas. Às que disseram não aos sem-noção das "cantadas" de rua, que não passam de ofensas gratuitas. Às que disseram não às gentilezas sexistas que falsamente se pretendem gentis mas apenas nos colocam num lugar menor por sermos mulheres. Às que disseram não ao chefe engraçadinho que olha pros seus peitos em vez de olhar para o seu doutorado. Às que disseram não aos "amigos" que classificam as mulheres entre putas e "pra casar" mas não vêem problema nenhum na liberdade sexual masculina. Às que disseram não ao grito e à força física masculina como forma de opressão. Às que disseram não à tia que insiste em perguntar cadê o seu namorado mas esquece de suas conquistas acadêmicas. Às que disseram não aos que dizem que há trabalho de homem e trabalho de mulher, metem a mão e consertam o encanamento (podem contratar meus serviços, sou boa nisso!). Às que disseram não à tantas estruturas tidas como "normais" mas que foram construídas sobre uma perspectiva paternalista e machista de mundo.
Hoje é mais um dia para explicarmos (ou quer que eu desenhe?) que feminismo não é radicalismo e muito menos o oposto de machismo. É a luta diária pela libertação das mulheres que, sem escolha, já nascem encaixadas em padrões sexistas de mundo. Enfim, entendam isso. É o melhor presente que podem dar às suas mães, irmãs, filhas, sobrinhas, todas as mulheres que te rodeiam.

Uma ode às desobedientes!


Por um dia da mulher interseccional

Flavia Ginzel


Nós, mulheres, ganhamos menos do que os homens.
Os postos de trabalhos mais precarizados, são ocupados por mulheres.
Segundo o Ministério da Saúde, o aborto é a quinta maior causa de morte materna no Brasil.
De acordo com dados do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, o número de negras mortas em decorrência de um aborto é 2,5 maior em relação às brancas.
Dados do relatárorio da ONG internacional Transgender Europe de 2014, mostram que Brasil é o país onde ocorre o maior número de mortes de mulheres travestis e transexuais no mundo.
Cerca de 6% das vítimas de violência sexual, são mulheres lésbicas. Estas mulheres são vítimas de um crime denominado "estupro corretivo", que tem como objetivo punir a mulher lésbica pela sua orientação sexual.
Enquanto mulheres, somos todas oprimidas. Mas negras, trans e lésbicas morrem mais.

Neste sentido, convido todxs a refletir sobre privilégios e lutar por um feminismo que represente as mulheres trabalhadoras, negras, travestis e transexuais, lésbicas; enfim, todas as mulheres que são oprimidas e exploradas pelo sistema capitalista e patriarcal em que vivemos.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Crise da masculinidade!?


O ser hegemônico está começando, bem lentamente, a cair. Exatamente meu amigx, o masculino está em crise, e tem muita gente preocupada como isso. O que faremos após o fim do ser másculo, símbolo do padrão social? O que vocês farão eu não sei, eu soltarei fogos! Comemorarei alegremente a morte desse elemento que só tem causado estragos na sociedade. O masculino que se vá e já vai tarde, em minha opinião.
Isso quer dizer que não haverá mais homens, parrudos e peludos em nosso meio? Se acalme caçador de ursos, não vamos nos desesperar, o que está em crise não são os modelos de gêneros, ou os modos de comportamentos, ou de identificação. O que está em crise é o sistema de poder do “sujeito masculino”, não as diversas manifestações e possibilidades da vida.
O que está em crise é o papel do masculino na sociedade, pois esse só se mantinha quando o feminino estava bem estabelecido, mas o feminino, como símbolo da submissão já está a caminho de ser enterrado, depois de séculos de opressão das mulheres sobre a efígie de que para ser mulher tem que ser feminina, hoje existem mulheres dos mais variados tipos, a profecia de Virginia Woolf se cumpre, a rainha do lar está com seus dias contados.
Se não tem o modelo de oposição, ou melhor, se as oprimidas estão jogando o opressor de cima de suas costas, lógico que o papel de opressor vai entrar em crise. Sem escravos o feitor perde seu papel social. Isso tem feito muitos homens “masculinos” – para não dizer machistas, pois é feio chamar alguém de machista, se o faço já vão me tachar de apoiador das feminazis e gayzista – percam o rumo, o que vão fazer sem o doce privilégio de humilhar e submeter as mulheres a sua vontade?
O que está em crise de fato, não é a masculinidade, mas sim o machismo, o opressor está perdendo, lenta e vagarosamente, infelizmente, seus privilégios. O pouco que já perdeu foi motivo para criar um estardalhaço nacional, mobilizar pesquisadores e universidades para estudar o fim do macho e sua representação, mas o que de fato se estuda é o fim do poder do machista e como isso, olha só, tem afetado a estima do coitado.

Mas caros seres em desespero se acalmem, pois para infelicidade do mundo, tem muita água para correr ainda antes que esse modelo de opressão se vá, o morto ainda geme, a crise ainda está em processo e dentro do barco da história, tudo pode acontecer. Só espero que tenhamos força para dar o ultimo golpe de misericórdia nesse ser que está agonizando, antes mesmo de sentir a verdadeira dor que à de vir pela frente, a dor do fim dos privilégios.

domingo, 22 de fevereiro de 2015

“Existe amor em tempos de Tinder?”



Navegando no Facebook leio a pergunta de uma amiga: “Existe amor em tempos de Tinder?” Isso me fez pensar sobre a questão dos sentimentos em nossa sociedade, como estão sendo tratados os sentimentos? Como estamos lidando com o sentir? Como lidamos com as dores e os afetos?
Como resposta inicial a questão: “Existe, assim como temos um aumento da dificuldade de construir relações, assumir o que sentimos e criar laços... Não que falt[e] amor, nos falta coragem para assumir que amamos.” Vamos fazer uma análise em dois blocos, a primeira focara a nossa dificuldade em criar laços, a segunda no nosso medo das relações.
Não sei se você já reparou, mas o mundo está ultimamente em uma velocidade frenética, tudo está muito rápido, somos bombardeados a todo o momento por milhares de informações, a noticia envelhece na velocidade do click do mouse, junto com isso a tecnologia se renova muito mais rápido que a lei de Moore, a novidade fica obsoleta em poucos dias. Além da obsolescência, necessária para manter o “doce mercado” funcionando, somos instigados constantemente a trocar o que temos – e o que somos -, seja o vestuário, o computador, ou celular[1]. Não tem nada mais chocante que você ver alguém mechando em um celular que não está apto a ter todos os app’s do mundo dentro dele, principalmente os de mensagem e de “pegação”.
Esta instigação constante a troca das mercadorias cria em nós um asco pelo velho, uma desejo que rejeita tudo o que for antigo, passado, que tenha mais de duas semanas. Estamos sempre à busca do novo, da nova sensação do momento, “bem-aventurado o ser atualizado” está no evangelho do mundo “pós-moderno”.
Você deve estar pensando, o que o mercado tem a ver com a questão dos nossos laços afetivos, simples, tudo, ou quase tudo[2]. O mercado é um construtor de subjetividade, vivemos em uma sociedade capitalista que produz subjetividades capitalista e fascista.[3] Não irei aprofundar na questão, tem alguns livros na referência que podem ajudar, mas em resumo é o seguinte, a velha do Marx funciona que é uma beleza, o modo como organizamos as relações sociais, que dentro da nossa sociedade se da pela de dois modos, consumidor/mercado, empregador/empregado, influência o modo como às pessoas se comportam, isso exagerando para ser didático.
Simples, olha como era o mercado nos anos 1950, tudo durava, um carro era para a vida toda, assim como o casamento, a casa, a profissão, o mercado vendia o que durava, hoje o mercado vende o que é descartável. O modo como nos relacionamos é encarando o outro como um ser descartável, uma mercadoria, algo para ter, usar e depois esquecer que um dia esteve junto.
Do mesmo modo que não criamos vínculos com o celular, pois ele deve ser trocado o mais depressa possível por um modelo mais novo, não criamos laços sentimentais com os outros, pois as pessoas devem ser trocadas o mais rápido possível. Cruel? Exagerado? Será que estou sendo caótico em minha análise? Pode até ser, mas pare um minuto e pense nos seus relacionamentos, é fácil confiar? Criar vinculo? Entender o outro? Ou você elimina a pessoa no primeiro sinal de que não vai dar certo?
Vamos ser sinceros, com tantas opções por ai, para que ficar perdendo tempo com alguém que não está dando certo? Ou então, para que ter um relacionamento sério, vamos nos negar de experimentar o mundo para criar vínculos? Temos tempo para isso?
Estou muito longe para falar de monogamia, romantismo idílico, ou qualquer outra coisa que lembre as princesas da Disney, longe de mim ser defensor da moral e dos bons costumes. Mas uma coisa é fato, muitos de nós não conseguimos ficar com alguém tempo suficiente para dizer que ama a pessoa. Isso por puro medo, pois ao escolhermos está pessoa, geralmente, temos que dizer não a todas as outras possibilidades, e quem quer fechar os caminhos dos mais variados tipos de satisfação, para ficar com apenas com um?
E na “escolha” dessa pessoa passam por nós diversos pensamentos, muitos em um egoísmo profundo do “eu”, será que eu serei feliz? Será que eu serei satisfeito? Será que eu não vou me machucar? O “nós” está fora de moda, tirando alguns poucos românticos por ai, as relações são de função unilateral, o “eu” é o centro dela, o outro que me de orgasmo.
Isso se deve a própria sociedade que fala o tempo todo para nós que temos que buscar a nossa identidade, nosso sucesso, nosso paraíso na terra, o nosso bem estar, nossa satisfação, etc...
Esquecemos o que é o coletivo, vivemos na sociedade dos indivíduos, esse não como a menor parcela do social, mas como um ser fora do social, esquecendo que o ser humano é um ser social, forma-se, cria-se e constitui sentido para vida no meio social. Perdendo o contato com o social, seja o próximo ou o distante, estamos deslocados dos laços, se temos que buscar o melhor para o individuo, não nos permitimos o contato com o outro, nos isolamos, não permitimos ser afetados pelas experiências, pois experimentar é colocar a certeza da satisfação em risco.
Outro elemento da sociedade atual é a busca pelo anestésico que vai nos tirar toda a dor, buscamos algo que tire de nós a capacidade de sentir, pois sentir incorre em ter dor muitas vezes, de chorar, de ter desespero, de perder total e completamente a estabilidade. Somos infantis de mais para lidar com nosso choro e com a percepção da nossa incompletude, somo crianças e não compreendemos como o fato de ser afetado nos molda, modifica e amadurece, queremos sempre a alegria demonstrada na propaganda de margarina, a família perfeita, ou na do desodorante e cerveja, o prazer sem fim (para os homens, pois a mulher é sempre o objeto a ser possuído), a alegria da propaganda de maquiagem, ou da agencia de viajem.
A tristeza é proibida em nossa sociedade. Todos os tristes serão tachado de depressivos, medicados e tratados, pois como não ser feliz na sociedade livre onde tudo se pode ter e consumir?
Deste modo entramos nos dois elementos que impedem de criar laços e de viver o amor, pois a duração dos laços são proibidos, a renovação é ordem, junto disso a tristeza não é permitida, então como amar, se amar é correr o risco de não ser correspondido ou de um dia deixar de ser amado, ficar triste e chorar, vivamos somente a alegria dos amores rápidos e descartáveis, que o Tinder e seus iguais nos oferecem.
O amor existe, está ai, para quem tiver a coragem de assumir o risco da experiência, de aceitar criar laços de longa duração, de estabelecer contatos e de sentir, sem medo de que a dor seja um dos resultados da experiência da vida.



[1] Zygmunt Bauman, Capitalismo parasitário, Zahar Editora
    _______________, Cegueira Moral, Zahar Editora
[2] Antonio Gramsci, Americanismo e fordismo, Hedra
[3]Félix Guatarri e Suely Rolnik,  Micro Política: Cartografia do desejo